Uma semana de confronto entre números de levantamento de safra, tanto Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) quanto Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontaram para mais uma queda na produção de grãos do país, por outro lado, o alerta vermelho das questões climáticas. Parece combinação, a queda na produção é a loucura do clima que veio com seca no plantio da soja que fez com que a janela do milho ficasse pequena, e o plantio fora do zoneamento em muitos casos, depois veio geada histórica pegando em cheio os cafeicultores, sem falar em hortaliças com efeito direto da geada, especialmente nos cinturões verdes das grandes cidades. Um cenário que vamos sentir os efeitos no curto e no médio prazo. Inflação já aprontou para cima dos brasileiros. Colher 20 milhões de toneladas a menos do que o potencial é mexer com toda economia.
O Brasil tem um foco considerável em soja e milho para exportação, deixa o espaço mais restrito para o crescimento de arroz e feijão. Uma mudança de perfil vem junto com a pressão nos preços em anos como este. Imagina que o milho impacta direto na produção de proteína animal. Nos anos 2000 o arroz, por exemplo, ocupava 3,2 milhões de hectares de área plantada e hoje estima-se 1,6 milhões hectares. Mas vale lembrar que no caso do arroz tem toda uma conjuntura de preços e estímulos, além da concorrência com importação. Feijão é outra cultura que sempre foi uma loteria nas mãos dos produtores, entre o lucro momentâneo e o prejuízo, em 20 anos reduziu a área plantada em mais de 70 por cento.
Não temos risco de desabastecimento. Isso que tem que ficar claro. Mas a tendência é sim de aumento nos preços da cesta básica. Até onde, e até quando, são questões que devem ser analisadas a cada safra. A pecuária mesmo só deve recuperar o nível de abate de 2019 em 2023.
Um quebra cabeça entre planejamento, clima, mercado. Temos que lembrar que a Conab não tem mais estoque público já faz um tempo, só tem estoque residual de milho. Não tem mais nada de trigo e arroz. Por isso não houve a intervenção com leilões de estoques no caso do arroz. E quando vem esse apontamento de dedo para cima do aumento nos preços do arroz, a cultura vem causando prejuízos há muitas safras para os produtores que não tiveram ajuda de instrumentos de política agrícola efetiva, estrutural para o setor.
O cenário de planejar uma safra segue sendo um desafio muito grande. Incerteza do clima que gera maior fortalecimento do seguro rural, criam um convencimento maior da necessidade de seguir investindo ainda mais em produtos adequados para atender os produtores, e a importância do Programa de subvenção do seguro rural que precisa de mais recursos para reduzir o custo dos produtores. Seguro rural significa manter o homem no campo quando vem eventos climáticos de grandes proporções. Não temos a fórmula de uma receita mágica, estamos falando da locomotiva agrícola do mundo, em meio a uma pandemia, efeitos climáticos e uma guerra política que não deve reduzir a pressão nas próximas duas safras.
Marcelo Lara- Consultor de Comunicação.